top of page

Breves esclarecimentos sobre o dano moral à pessoa jurídica

  • Maria Rita Oliveira e Caldas
  • 31 de out. de 2022
  • 7 min de leitura

RESUMO:

O presente artigo tem a finalidade de esclarecer e orientar pontos firmados pela legislação, doutrina e jurisprudência,no que tange ao dano moral aplicado para Pessoas Jurídicas. Colocando em primeira análise, a proteção a bens extrapatrimoniais como algo ancestral e mutável, como também, dependente da sociedade que a deu origem. Feito esse estudo introdutório, serão trabalhados detalhes e especificidades do dano moral, como por exemplo, como ele afeta as pessoas jurídicas, como é feito o cálculo para reparação, quais legislações são cabíveis, dentre outros pontos. Finalizando com o intuito de tornar acessível e conhecida a informação que os direitos da personalidade são em sua maioria, cabíveis também para as pessoas jurídicas.

PALAVRAS-CHAVE: Dano moral. Pessoa jurídica

ABSTRACT:

The purpose of this article is to clarify and guide points established by legislation, doctrine and jurisprudenceregarding moral damages applied to Legal Entities. Puttingfirst, as the protection of off-balance sheet assets issomething ancestral and changeable, depending on thesociety that gave rise to it. Once this introductory study isdone, details and specifics of moral damage will beworked out, such as how it affects legal entities, how thecalculation for reparation is made, which laws are applicable, among other issues. Finally, in order to makethe information that personality rights are mostlyaccessible and known, they are also applicable to legal entities.

KEY WORDS: Moral damage. Legal Entity

 

1 INTRODUÇÃO

Ao longo da contínua linha do tempo, a ideia de que era preciso reparar o dano à moralidade ou compensar algo que não diz respeito nem ao dano físico, nem ao patrimonial, no sentido puramente material, é algo trabalhado e regido pelos costumes e legislações de cada povo em diferentes épocas. Um exemplo é a legislação romana, em que consta nas XII tábuas, as ordenações malum carmen ou famosum carmem (versos infames)occentatum (injúrias). É possível perceber desse modo, que honra e reputação já tinham uma certa importância legal e social. O que por sua vez, possibilitou o conhecimento do legado em torno dessa reparação,deixando marcas permanentes, seja no ordenamento jurídico da Civil Law, seja no Common Law(LIMA,2016).

Outro exemplo de como a moral é objeto de legislação a muito tempo, é o direito na idade média. Época em que, a igreja tinha grande poder e influência,julgando e execuções segundo seu próprio conjunto normativo. Ou seja, por causa dessa forte influência, os bens extrapatrimoniais usufruíam de certa proteção legalística. Um exemplo era a defesa da honra, ou até mesmo o adultério ser crime. Logo, o que se podeentender disso é que, independentemente dos costumes e do entendimento do que (anacronicamente falando)afetaria ou não, a sua personalidade. Desse modo, o direitoatua como um acompanhante do pensamento que o é contemporâneo. Legislando, julgando, executando e se transmutando, de acordo com a sociedade está inserido,mas sempre cobrindo de alguma maneira, elementos que não são inteiramente patrimoniais. ​

E é sob a égide desse breve relato introdutório, comecemos, por conseguinte, uma análise mais profunda do tema proposto.  

2 DESENVOLVIMENTO

Diversos autores, incluindo De Plácido e Silva(1991), classificam a palavra “dano” juridicamente falando em uma mesma linha de raciocínio, que é:

Derivado do latim damnum, genericamente, significa todo mal ou ofensa que tenha uma pessoa causado a outrem, da qual possa resultar uma deterioração ou destruição à coisa dele ou um prejuízo a seu patrimônio. Possui, assim, o sentido econômico de diminuição ocorrida ao patrimônio de alguém, por ato ou fato estranho à sua vontade. Equivale, destarte, a perda ou prejuízo. Juridicamente, dano é, usualmente, tomado no sentido do efeito que produz: é o prejuízo causado, em virtude de ato de outrem, que vem causar diminuição patrimonial.

​Ou seja, o “dano” em uma linguagem jurídica genérica e nacional, estava intrinsecamente ligado a um caráter patrimonial, consequentemente, majoritariamentematerial. Entretanto, como visto na introdução, e estudando sob uma perspectiva mais profunda, entende-se a importância do dano para além do patrimônio, isso ocorre pelo fato de que, é a partir dele que é gerado o direito/dever de repará-lo.

Para os brasileiros, a chegada do Código Civil de 1916, constituiu uma importante base doutrinária, observa-se no seu artigo 927 o seguinte: “Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência, ou imprudência, violar direito, ou causar prejuízo a outrem, fica obrigado a reparar o dano”. Porém, a nossa legislação até o início dos anos 1980, não reconhecia o dano moral de forma isolada, reconhecendo sua existência, mas correlacionando-a obrigatoriamente ao dano material. Como se o dano moral fosse um reflexo, não cabendo desse modo, uma aparição processual solo. Isso vai mudando gradativamenteprincipalmente por causa das jurisprudências. Que dentro da norma, reiteram a proteção a bens que fogem ao patrimônio material.

​Todavia, foi na Constituição de 1988 que houve a divisão de águas, pois foi na nossa Carta Máxima que foi ratificada, claramente desta vez, a existência e validade do dano moral, nos seu Art.5º, V, X. Vejamos:

Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:

V - É assegurado o direito de resposta, proporcional ao agravo, além da indenização por dano material, moral ou à imagem

X - São invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação.

​Foi a partir desses avanços, que houve espaço para as legislações infraconstitucionais do Código Civil de 2002 e Código Do Consumidor. Sendo o primeiro responsável também, por aplicar a proteção dos direitos da personalidade para as Pessoas Jurídicas. Analisemos:

CC Art. 52 Aplica-se às pessoas jurídicas, no que couber, a proteção dos direitos da personalidade.

CC Art. 186 Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito 

CDC Art. 6º São direitos básicos do consumidor:

X - São invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação.

​Então, para um melhor entendimento, coloquemos uma ramificação do dano moral, que é a classificação objetiva e subjetiva. Pois, no dano moral subjetivo, não existem parâmetros concretos, envolve a própria subjetividade humana, e o que a parte autora sentiu, algo abstrato.

​Porém, a classificação que realmente nos interessa nesse momento é a chamada honra objetiva, lesão específica do direito, ligada exclusivamente aos direitos da personalidade, e comum as pessoas físicas e jurídicas. Isso é possível graças ao Art. 52 do CC, que roga: “Aplica-se às pessoas jurídicas, no que couber, a proteção dos direitos da personalidade”. Entretanto, tão importante quanto o artigo, e com um nível de especificidade maior, é a Súmula nº 227 do Superior Tribunal de Justiça que afirma “A pessoa jurídica pode sofrer dano moral” (STJ, 2011, p. 3). E vindo para complementar a linha de raciocínio encontra-se a 4ª Turma do STJ, em que escreve:

“A evolução do pensamento jurídico, no qual convergiram jurisprudência e doutrina, veio a afirmar, inclusive nesta Corte, onde o entendimento tem sido unânime, que a pessoa jurídica pode ser vítima também de danos morais, considerados estes como violadores da sua honra objetiva” (S. Teixeira, 1999).

Portanto, para que o dano seja enquadrado como objetivo, é preciso que tenha havido prejuízo concreto aos direitos da personalidade que podem ser usufruídos pela Pessoa Jurídica, frente ao caráter público que dispõe.  A vista disso, avaliemos:

“Podem ser citados exemplarmente como direitos da personalidade aplicáveis às pessoas jurídicas: honra, reputação, nome, marca e símbolos, à identidade, propriedade intelectual, ao segredo e ao sigilo, e privacidade. ” (MATOS,2005).

Isso significa que, não se pode ofender nenhum desses tópicos da pessoa jurídica, exatamente porque estão resguardados pelo CC e pelo CDC.

Existe ainda mais uma classificação do dano moral, que é o in re ipsa (não precisa provar a extensão do dano concreto causado). Mas em regra, a jurisprudência não o tem aplicado para as para as Pessoas Jurídicas, com a exceção da violação ao direito de marca, ou uso indevido desta. Nestes casos, a simples prova dessa violação é suficiente para requerer o dano moral.

​Havendo dessa forma, prova farta de que pessoa física ou jurídica, lesou algum desses bens protegidos pela Constituição e pelo Código Civil. A parte ofendida tem pleno direito de acionar o poder judiciário para requerer as devidas reparações.

​No que tange a reparação, o Código Civil argui sobre: “Art. 944 “a indenização mede-se pela extensão do dano”. Ou seja, a reparação do dano, tem a finalidade de compensar o ato ilícito sofrido, no dano material, isso é mais facilmente identificado, prevalecendo a tentativa que mais se aproxima do status quo ante. Todavia, não é tão simples assim quando se refere ao dano moral, não existe parâmetro que possa ser usado como equivalente à prestação pecuniária.

​Com efeito de substituir esse vácuo normativo, recorre-se as doutrinas, as jurisprudências, e ao poder discricionário do juiz. E sob essa perspectiva, que é válido colocar o pensamento doutrinário majoritário representado pelos escritos do professor Ramon Daniel Pizarro, percebamos:

“En cambio, cuando se trata de reparar el daño moral, el dinerocumple uma función diferente, netamente satisfactoria. Insistimos en que no se trata de alcanzar una equivalenciaexacta de índole patrimonial, sino de brindar una satisfaccióno compensación jurídica al damnificado” (PIZARRO. 1996).

​Isso quer dizer que, não podemos classificar da mesma forma a reparação do dano material e a do dano moral, pois esta última não atua como forma de equiparar-se a algo. Até porque, é nítida a inviabilidade de tentar emparelhar lesões extrapatrimoniais. Mas a compensação monetária que não deixa de ser efetiva, reconhecendo e responsabilizando os desrespeitos aos direitos dapersonalidade que cabem igualmente para Pessoas Jurídicas.

3 CONCLUSÃO

Por fim, é devido à pouca idade da doutrina, quepersiste o desconhecimento de que empresas ou qualquer outro tipo de Pessoa Jurídica, são incluídas normalmente na maioria dos direitos e obrigações concernentes a personalidade. Sendo assim, situações como, abuso da marca, prejuízos a reputação frente a terceiros, ou alguém, que de algum modo, feriu de forma concreta a imagem daquela PJ, de maneira que se verificaram perdas no faturamento decorrentes daquele ato ilícito são plenamente cabíveis de reparação. Dito isto, é possível, viável e aconselhável que determinada pessoa inscrita no CNPJ, procure orientação legal para conhecer melhor o tema, e saber com detalhes quais são os direitos que lhe cabem.

 

 

 

REFERÊNCIAS

BRASIL. Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002. Institui o Código Civil. Diário Oficial da União: seção 1, Brasília, DF, ano 139, n. 8, 11 jan. 2002.

LIMA, André Barreto. Visão histórica do direito à honra. Revista Âmbito Jurídico, Bahia, 1 de ago. de 2016. Disponível em:https://ambitojuridico.com.br/cadernos/direito-civil/visao-historica-do-direito-a-honra/amp/. Acesso em: 31 de out. de 2021.

MATOS, Eneas de Oliveira. Direitos da personalidade e pessoa jurídica. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 10, n. 797, 8 set. 2005. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/7247. Acesso em: 31 out. 2021.

PIZARRO, Ramon Daniel. Dano moral: prevención, reparación, punición. Buenos Aires. Editoria: Hammurabi1996. Acesso em 31 de out. de 2021

REIS, Clayton. As funções da indenização e os parâmetros para aferir a dor moral In: REIS, Clayton. Dano Moral- ed.2019. São Paulo (SP): Editora Revista dos Tribunais.2019. disponível em: https://thomsonreuters.jusbrasil.com.br/doutrina/1290405237/ dano-moral-ed-2019. Acesso em: 31 de out. de 2021.

SILVA, Oscar Joseph de Plácido e. Vocabulário jurídico: I--lugar e Tempo. II-- Pessoas. III Coisas. IV-- Fatos. 3ª. ed. rev. Rio de Janeiro, Forense: Imprenta, 1991. v. 4º. Disponível em: https://www.lexml.gov.br/urn/urn:lex:br:rede.virtual.bibliotecas:livro:1982;000095166. Acesso em: 31 out. 2021.

 
 
 

Comentários


Copyright 2022 © Todos os direitos reservados. CR Advocacia.

bottom of page